Tuesday, October 10, 2006

55

Tenho vontade de te amar.
Tenho gana de te matar
de tanto amor.
Te odeio porque te amo.
Meu amor é possessivo, estranho.
E me faz ter medo de amar.
Você é como um sonho,
que no meio se torna pesadelo.
Te quero e tento te afastar.
Não sei se quero te ter
totalmente por ter medo.
Você é minha dor física,
minha ânsia espiritual.
Meu consolo e meu remédio.
Minha válvula de escape.
Meu meio de lutar com o tédio.

1978

53

A mão levantada.
O punhal preparado, a dor,
a morte, a lágrima, a sorte,
a cor do sangue, o frio,
a janela aberta, os dedos,
a cama desfeita, o ódio cego,
o beijo mal dado, o olho fechado,
o punhal cravando, o amor mal feito,
a dor se apagando, a solidão,
o sonho totalmente desfeito,
a raiva descontrolada, a mão,
a procura incessante, a perda,
a grande mágoa, a tristeza,
vida que some, amarga luta,
fio preso da esperança,
o punhal cortando, a labuta,
e a espera da criança.

1978

51

Minha voz tão rouca
Meu grito feito louca
Uma escuridão em minha boca
Milhares de seres em minha roupa
Minha cuca, muito solta
Minha amargura não é pouca

Meu corpo gira na noite
Meu pensamento é como açoite
Meu desejo é uma porta
numa reta sempre torta

Quero amar mas tenho medo
cada vez me vem mais cedo
cada vez mais eu me puno
cada dia mais não durmo
cada dia mais eu sumo

Minha boca pede um pano
que me evite gritar na escuridão
que eu amo, amo e amo
e me entrego mais à solidão.

Amor

Você é sempre, é tão, é incrivelmente distante.
Quando eu penso em te alcançar, você me foge.
Quando eu penso em te ter, você me some.
Quando eu penso em te prender, você escapa da minha mão.
Você é arredio, chega, fica, magoa (muito) e depois...
Você é ligeiro no bote, e vive na espreita,
esperando um pato qualquer pra te acreditar.
Você vem, nunca se cansa de vir, de ir embora.
Você está sempre à espera do ser errante,
sempre cada vez mais perto, nunca longe.
Você é o animal faminto, o que sempre come.
Você é o ser louco, você é o ser são.
Você respeita, quando não, você desrespeita.
Quando te espero, quando te quero amar,
você me goza, me machuca e afinal, agora...
Você me voltou, não sei mais qual a vez.
Não sei nunca se te conheço ou se penso isso,
penso que te conheço, que te manjo, te entendo.
Mas não é nada disso, você é desconhecido
pra mim, quanto mais te tenho, mais falta me faz.
Quando não te tenho, te quero cada vez mais.
E quando você me volta, me rói por dentro.
Não te quero e você entra em mim, como agora.
Não te espero e de repente você chega, como hoje.
Não te conheço, realmente é essa a verdade.
Pendo saber muito sobre você e nada sei.
Mas ao mesmo tempo não consigo viver sem você.
Na verdade, você faz parte do meu ser.
Você é como uma parte do meu corpo,
e vai me consumindo aos poucos...
E sempre, e tanto, e de tal forma,
que me prendo, mesmo não querendo,
me faz sofrer, mesmo não sofrendo,
e me faz amar, mesmo eu desconhecendo
como você é por inteiro.

47

Fui eu quem quis
o amor, a fossa, a dor.
Fui eu quem quis
a solidão e a tristeza.
Fui eu quem quis
ver a lágrima rolar,
a minha lágrima.
No meu rosto,
o meu choro
o meu gosto
salgado de lágrimas
em minha boca.
Fui eu quem quis
que o meu rosto se desfizesse
camada por camada
sob a ação da água
que cai do meu olho.
Fui eu quem quis
que o meu rosto se apagasse
que eu mesma sumisse
como uma pessoa incolor
que vive uma vida
que também não tem cor.

45

O mundo gira
e eu caio.
De dor, de febre,
de amor, de porre,
não sei.
O mundo continua,
lenta volta, universal.
Um dia, uma noite,
mais uma semana
ou um mês que se passa.
E eu aqui...
levantando, caindo,
uma, duas, três ou
mil vezes. Não sei.
Tenho consciência
de que vivo e
de que sou gente.
E de que o mundo gira
dentro e fora de todo mundo.
O mundo gira e eu caio novamente.
Aonde me segurar?

45

O mundo gira
e eu caio.
De dor, de febre,
de amor, de porre,
não sei.
O mundo continua,
lenta volta, universal.
Um dia, uma noite,
mais uma semana
ou um mês que se passa.
E eu aqui...
levantando, caindo,
uma, duas, três ou
mil vezes. Não sei.
Tenho consciência
de que vivo e
de que sou gente.
E de que o mundo gira
dentro e fora de todo mundo.
O mundo gira e eu caio novamente.
Aonde me segurar?

43

Corra, sangue,
em minhas veias,
artérias e olhos.
Faça meu coração pulsar.
Encharque de sangue
meus pés, braços e pernas,
mãos, cabelos e dedos.
Faça minha boca
sentir seu úmido gosto.
Gosto vermelho de nada.
O certo seria limpá-lo.
Mas não, eu o quero
escorrendo sobre mim,
sobre meu corpo.
Eu o quero fazendo
poças aos meus pés.
Escorrendo como um rio infinito,
sem ondas, pontes ou diques.
Quero ver meu sangue
correr, sujar e limpar.
Levar tudo que tenho por dentro
de podre, de prestável ou não.
Todo o azul, o verde ou amarelo
que eu venha a ter ou tenha tudo.
Quero ver meu sangue correr
e sair por todos os lados de mim.
Quero tudo escrito por mim e de mim,
com o sangue que é meu.

1975